segunda-feira, 27 de abril de 2009

Quadrinhas

Meu ofício
É como artesanato
Tanto mais aprendo
Quanto mais faço.

Minha dor
É minha companheira
Lança sem pudor
Âncora ligeira.

Meu amor
É como um velho vício
Tanto mais calor
Quanto precipício.

Minha vida
Pulsar de cursor
Que parece vida
No computador.

Teus olhos são
Fiéis depositários
De que o verso não é em vão
Nem solitário.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Carta à Musa

Jovem Mulher com a gloriosa manhã em seu cabelo, de Jules Joseph Lefebvre


Desculpe se só sei ser desse jeito
Humano ser cheio de defeitos
Sonhando com o inexistente ser perfeito
Que perfeito é apenas o sonhar.

Desculpe se sou falho, se me alheio,
Releve se não sei viver, se anseio,
Perdoe se só sei ser desse jeito
Desse jeito imperfeito de sonhar.

Se sou mesmo indecifrável, pleno, insano,
Se não passo de um terrível desengano
Descarta-me se não caibo no teu plano
Que um sonho é tão difícil de largar.

Mas se olhas no espelho e vês meu rosto
Nessa imagem, clara e límpida, teu sonho
E para além dessa imagem vês meu nome
Para além de um mero nome um ser humano.

Vem sentir a minha essência mais insone:
O desejo de sentir gosto por gosto
Cada parte desse amor que nos consome
E que some com uma parte desse todo.

Esquecimento

Ontem, hoje, amanhã,
Calendário mais perverso,
Quisera lembrar de ti,
Quisera, mas não consigo.

O rosto que me esquecia
Na fímbria do dia-a-dia
Ao mesmo tempo é eterno
Naquela fotografia.

Emoldurada e vazia
De qualquer significação,
Dormita na cabeceira,
Mas não em meu coração.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Oração

Gravura de Carlos Botelho



Peço-te lucidez, Senhor.
Rogo-te humildemente,
Em nome da terrena condição,
Que não me cegues neste labirinto
De paixões.
Que nele, aos tropeções,
Eu nunca chegue até onde, perdido,
O homem já não pode
Saber até que ponto é consentido
O jugo que sacode.

Miguel Torga.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Poema Vencido

Senti a mediocridade
Que agora creio inata
E um verso psicopata
Me chicoteia a verdade:

Não lutes mais com a palavra
Deixe-a em paz, sem saudade,
Vivas a vida que a idade
É conselheira sensata.

Desista de tudo e vejas
Como é tão leve a conduta
De arejar tua casa

Basta abrir as janelas
E rasgar as folhas brancas
Antes que fiquem amarelas.